sábado, 13 de junho de 2020

Antônio Cícero Guardado pra sempre

GUARDAR


Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la. 
Em cofre não se guarda coisa alguma. 
Em cofre perde-se a coisa à vista. 
Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por admirá-la, isto é, iluminá-la ou ser por ela iluminado. 
Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por ela, isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela, isto é, estar por ela ou ser por ela. 
Por isso, melhor se guarda o vôo de um pássaro 
Do que de um pássaro sem vôos. 
Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica, por isso se declara e declama um poema: 
Para guardá-lo: 
Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda: 
Guarde o que quer que guarda um poema: 
Por isso o lance do poema: 
Por guardar-se o que se quer guardar.

Antonio Cicero




UM EU QUALQUER
            Para Antonio Cícero

dentro da gente
há muitos, tantos,
que o pensamento
pode sequer
bem calcular.

o que se sente,
quem sente? canto-os
e assim me invento,
um eu qualquer,
sem rumo ou lar.

dentro da gente
há vários... quantos?
neste momento,
um outro quer
se revelar. 


Adriano Nunes.Laringes de grafite.  Porto Alegre: Vidráguas, 2012.











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